A título de informação
Por Marco Haurélio
Pelejas virtuais não são incomuns em tempos de redes sociais e de serviços de mensagens instantâneas. Braulio Tavares, por exemplo, já havia contendido com Klévisson Viana e Astier Basílio. As várias modalidades foram debulhadas em trocas de e-mails, portanto, ainda sem a presença de uma “plateia”. Não parece, mas disputas do tipo vêm de longe, desde 1997, quando Américo Gomes, da Paraíba, e José Honório, de Pernambuco, desfraldaram a bandeira. Há inclusive uma pesquisa ampla, um inventário transformado em tese de doutoramento e em livro, com o inusitado título No Visgo do Improviso ou a Peleja Virtual entre a Cibercultura e Tradição, de autoria da professora Maria Alice Amorim.
O diferencial desta nova peleja é que o palco foi a maior das redes sociais, o Facebook, entre os dias 7 e 14 de setembro, nos poucos minutos de folga de que dispúnhamos. E, como em todo bom pé-de-parede, a nossa gesta virtual foi acompanhada por um grande público, com sugestões de temas e motes e eventuais aplausos. Começamos com a tradicional sextilha, evoluímos para o martelo agalopado, com mote proposto pelo poeta, pesquisador e apologista Ésio Rafael, passamos à gemedeira, por sugestão do também poeta Rouxinol do Rinaré, e ao galope à beira-mar (versos hendecassílabos). A disputa abarcou ainda outras modalidades: No tempo de Pai Tomás, Preto Velho e Pai Vicente, Nos oito pés a quadrão (oitavas), martelo alagoano (decassílabos). Os versos de despedida foram embalados pelo mote Povo bom, muito obrigado/ Adeus, até outro dia!
Agora publicada em folheto pela Tupynanquim Editora, de Klévisson Viana, com capa em xilogravura de Maércio Siqueira, a peleja alcança novos leitores, promovendo o casamento antes inimaginável da tecnologia com a tradição.
Abaixo, parte da peleja, em galopes à beira-mar (versos de 11 sílabas com tônicas na 2ª, 5ª, 8ª e 11ª sílabas):
MH
Mudando de estilo, por outras paragens,
Sigamos agora com nossa peleja:
Da grimpas dos Andes à chã sertaneja,
O verso permite diversas viagens.
Sem Timothy Leary a encher as bagagens,
Com fome e com sede do eterno buscar,
Nas tábuas de argila, nas mesas do bar,
Na longe Cocanha ou na caixa-prego
Na luz escondida nos olhos do cego,
Nos dez de galope na beira do mar.
BT
A rima deixada é a mesma que eu pego,
E ligo o motor pra subir nas alturas,
Nas asas do vento das literaturas
Eu vôo e eu nado, mergulho e navego.
Meu verso é composto de peças de Lego
É só ir pegando e depois encaixar
Formando um conjunto que dê pra cantar
Dizendo as belezas do mundo da escrita
Em verso e em prosa se escreve e recita
Cantando galope na beira do mar.
MH
Na velha Tebaida, me fiz eremita,
De lá alcei voo pra os mares do sul,
Vi Constantinopla virar Istambul,
E a sanha cruzada na terra ‘bendita’;
Vi Fitzcarraldo, com grande pepita,
Na verde floresta querer navegar,
Cantando uma loa para o rei Lear,
Pensando se estava tão longe ou tão perto.
Cansado de tudo, voltei ao deserto,
Sonhando que estava na beira do mar.
De lá alcei voo pra os mares do sul,
Vi Constantinopla virar Istambul,
E a sanha cruzada na terra ‘bendita’;
Vi Fitzcarraldo, com grande pepita,
Na verde floresta querer navegar,
Cantando uma loa para o rei Lear,
Pensando se estava tão longe ou tão perto.
Cansado de tudo, voltei ao deserto,
Sonhando que estava na beira do mar.
BT
Tornei-me famoso por ter descoberto
os grandes tesouros de terras distantes;
lutei contra gregos, salvei os atlantes,
mostrei a Colombo o caminho mais certo.
Na Besta Fubana do tal Luís Berto
montei corajoso e me pus a voar,
cruzando o espaço na luz do luar
por entre uma nuvem de naves e drones
igual um dragão de um Game of Thrones
cantando galope na beira do mar.
os grandes tesouros de terras distantes;
lutei contra gregos, salvei os atlantes,
mostrei a Colombo o caminho mais certo.
Na Besta Fubana do tal Luís Berto
montei corajoso e me pus a voar,
cruzando o espaço na luz do luar
por entre uma nuvem de naves e drones
igual um dragão de um Game of Thrones
cantando galope na beira do mar.
MH
Na terra tomada por fogo e ciclones,
Sorri o tirano de juba acaju,
Sentindo no rabo o tridente de Exu,
Enquanto se estorce na guerra dos clones;
E sobre as ruínas não há cicerones,
Nem sheiks barbudos e nem lupanar.
A paz posta a ferros, a guerra a gritar
E agentes laranjas trazendo pavor,
Deixando giestas na cova do amor
Nos dez de galope na beira do mar.
BT
País que se preza não quer salvador
Nação com moral não precisa de heróis
Precisa de votos, precisa de voz,
Lutando, cantando, do jeito que fôr.
Na hora difícil se sente o valor
Do quanto se perde e não pode salvar,
A guerra é a guerra, a terra é o lar,
O chão é do povo, a vida é da gente,
O mundo é cruel, mas a alma é valente
Nos dez de galope na beira do mar.